quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

A Separação [2011]


(de Asghar Farhadi. Jodaeiye Nader az Simin, Irã, 2011) Com Peyman Moadi, Leila Hatami, Sareh Bayat, Shahab Hosseini, Sarina Farhadi. Cotação: *****

O cinema iraniano é pouquíssimo difundido pelo mundo. Aqui no Brasil, se não existissem os festivais e o esforço dos organizadores para trazer essa leva alternativa, talvez nem chegaríamos ao menos a conhecer os principais títulos dessas obras, que se baseiam basicamente em narrativa. “A Separação”, o mais novo filme do diretor Asghar Farhadi após relativo sucesso de “Procurando Elly” (2009), e um típico exemplo do que os iranianos mais prezam na forma de contar uma história. Sem se atentar a um orçamento abarrotado ou grandes estrelas, “A Separação” se sustenta em uma direção interessante e um roteiro que faz jus a todo sucesso que o filme anda conquistando, após sair como grande vencedor do último festival de Berlim, e provável Oscar de melhor filme estrangeiro.

Quando Nader (Peyman Moadi) e Simin (Leila Hatami) resolvem se divorciar após 14 anos de união, eles travam uma disputa para saber com quem ficará a filha do casal, Termeh (Sarina Farhadi). Nader, que se recusa a ir para o exterior com a esposa (vem daí o motivo da separação) para cuidar de seu pai, que se encontra debilitado em decorrência de Alzheimer. Símin, a mãe, continuará tentando fazer com que sua filha a acompanhe numa nova vida, já que ela quer um futuro melhor para as duas, algo que no país onde moram pode ser difícil. Em meio a essa disputa, Razieh (Sareh Bayat), a cuidadora do pai de Nader, acaba sendo o epicentro de uma série de confusões emergidas na falta de comunicação, confiança e religiosidade, que culminará em reações inesperadas que afetarão todos os personagens.

No meio de todo o desenrolar desse belíssimo filme, o mais interessante é notar que ninguém ali é culpado, ao mesmo tempo em que todos, invariavelmente, tomaram atitudes que reforçaram o acaso a trabalhar contra eles mesmos. Todos os personagens, trabalhados de maneira honesta por Farhadi, são tão imprevisíveis, que fica difícil não nos impressionarmos pelas suas reações quando elas se fazem necessárias. É complicado lidar com problemas que estão enraizados numa cultura bem diferente da nossa. Lá, a religiosidade acaba tornando a sociedade bem mais opressora, e jurar por algo que foi (ou não) feito em cima do Corão, poderá tornar a verdade mais nítida do que num julgamento civil. Contrapor as situações que os personagens vivem, numa visão mais palpável a nossa, nos fará ver que, em muitos aspectos, somos tão diferentes e tão semelhantes, dependendo da situação.

Dando continuidade ao elogio que faço ao roteiro de “A Separação” – que definitivamente eu considero a melhor coisa do filme -, é difícil não se sentir fisgado pelas discussões que o casal principal trava, e em como eles justificam os seus próprios atos. Simin, a mãe que pedira o divórcio (um ato de grande coragem naquele país), se ressente muito mais pelo fato do marido nem sequer tentar fazê-la mudar de idéia pedindo para que ela não saia de casa, do que pela negativa de não ir mais para o exterior, depois de tanto tempo de planejamento. Segundo ela, a filha do casal não escolheu ficar com o pai por uma questão de afinidade, e sim porque a garota tem a esperança de fazer com que seus pais se reconciliem. Esse tipo de leitura de personagens, dados em outros tantos exemplos no decorrer do filme, vai deixando a obra ainda mais rica.

Por ser mais humano do que qualquer outra coisa, “A Separação” deveria ser um filme muito mais reconhecido, o que, infelizmente, só será possível por uma questão de curiosidade (principalmente agora nessa época de premiações) do que pelo cinema iraniano em geral. Isso, também, não quer dizer que o filme deva ser subestimado. Pelo contrário. “A Separação” tem tudo para ser a melhor alternativa para quem procura um bom cinema, que esteja fora do eixo América-Europa.

2 comentários:

  1. eu não sei o que estou esperando pra conferir esse filme.

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  2. Filme maravilhoso, com um roteiro incrível e personagens excelentes. O maniqueísmo foge aqui, Farhadi conseguiu tirar o protagonismo e o antagonismo de seu filme com uma facilidade incrível. Na segunda sessão que eu vi o filme, o público se separou no cinema e torcia separadamente por cada personagem, uma coisa incrível.
    Abraços, e adorei teu texto, está ótimo! Uma ótima escolha pra filme, e você ainda trouxe todas as situações que A Separação apresenta pro público.

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