quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Histórias Cruzadas [2011]


(de Tate Taylor. The Help, EUA, 2011) Com Emma Stone, Viola Davis, Bryce Dallas Howard, Octavia Spencer, Jessica Chastain, Ahna O'Reilly, Allison Janney, Anna Camp, Sissy Spacek. Cotação: **

É estranho notar que um filme que tinha um potencial incrível possa ter se entregado a um direcionamento mais meloso, com a intenção de tornar seus espectadores em pudins de lágrimas e sair de maneira descarada na corrida pelas premiações. É uma pena, porque o filme tem profissionais de peso, principalmente em seu elenco, e conta com uma história interessante, baseado no (único) livro de Kathryn Stockett (que eu desconheço). “Histórias Cruzadas” inicia, se desenvolve e termina com um único objetivo: focar na recepção dos mais dramáticos e conquistar os acadêmicos e correspondentes estrangeiros.

Enquanto os EUA enfrenta ferrenhos e idealistas movimentos pelos direitos civis durante os anos 60, a jornalista recém-formada "Skeeter" Phelan (Emma Stone) tenta ganhar a vida no mundo editorial em Nova Iorque. Ao voltar para sua cidade natal, a pacata e racista Jackson, no Mississipi, ela percebe um fato alarmante. As crianças do lugar passam sua infância sob os cuidados de babás negras, e anos mais tarde, essas mesmas crianças vão tratar as mulheres que o criaram (ou a raça delas) com o maior desdém. Sem as mesmas preocupações que tem suas amigas de infância – todas casadas, com filhos e mantendo suas empregadas em regime de quase escravidão – Skeeter, estimuladas ainda mais pelos ideais de Martin Luther King, resolve escrever um livro contendo depoimentos das mulheres que sofrem com o preconceito dia após dia, como é o caso de Aibileen (Viola Davis) e Minny (Octavia Spencer).

A primeira evidência de que “Histórias Cruzadas” peca pela insistência em querer ser muito e não focar em algo que poderia render muito mais, é a sua quase descabida idéia de aliar o drama das mulheres negras do filme com um tempo considerável presenciando a vida das mulheres que as oprimem (nesse caso, as brancas). De maneira exageradamente dual, as dondocas interpretadas por Bryce Dallas Howard e Anna Camp, por exemplo, possuem um ar maquiavélico que faz com que nos tornemos céticos com tanta maldade. É óbvio que eu não vou aqui dizer que o racismo que imperou por anos entre os americanos nunca tenha existido. Isso é um fato histórico, infelizmente. Mas até mesmo os vilões dessa fase merecem um tratamento mais “humanizado” nos cinemas, por mais difícil que isso possa parecer. Senão fica aquele climinha de contos de fadas que não cai nada bem numa obra que quer ser levada a sério.

Se prestarem atenção, ao dizer que a população negra, durante esse lastimável período, só conseguiriam algum tipo de liberdade se alguns brancos ou se redimissem ou passarem por algum tipo de ameaça, “Histórias Cruzadas” acaba dando um tiro no pé, e beirando uma moral da história bem discutível.

As atuações, como já disse, são primorosas. Principalmente Viola Davis, o grande rosto do filme, e que merece todos os aplausos possíveis. Essa americana da Carolina do Sul já havia surpreendido em “Dúvida” (conseguindo indicação ao Oscar como atriz coadjuvante) e eu mesmo sempre elogiava suas presenças, mesmo que apagadas (como foi no caso do filme “Confiar”). Aqui, ela consegue a proeza de dar um banho de interpretação, com direito a uma complacência quase inexplicável, se utilizando apenas de alguns gestos e olhares que dizem muito mais do que a cena em questão apresenta. Isso, em um filme que tem ainda Emma Stone querendo dizer a que veio, Allison Janney fazendo a linha “pobre mulher adoentada” e Sissy Spacek quase esquecida, nem é preciso muito tempo para dizer que Viola rouba todo o foco para si.

“Histórias Cruzadas”, mesmo com a intenção clara de se fazer presente nas premiações (o que não chega a ser um defeito), se desvirtua completamente do seu caminho mais provocador para cair num campo mais melodramático. Pelo visto, tem conseguido conquistar parte do que queria. Nesse caso, merece os parabéns. Mas a que preço?

7 comentários:

  1. Eu estava ansioso, mas com o tempo a minha ansiedade para conferir este filme diminuiu bastante. Ainda quero ver, mas sem pressa.

    O filme só me interessa por conta das atuações mesmo. Nada mais.

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  2. Achei maravilhoso, um dos melhores filmes do ano, logo atrás de "Millennium" - uma história sobre racismo contada de forma diferente, cativante, bem escrita e quem diria até bem dirigida, um elenco espetacular que merece toda atenção que vem recebendo.

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  3. Somente boas atrizes e uma história absurdamente maniqueísta. Quis tratar o racismo, mas, em minha opiniõa, só conseguiu ser mais racista ainda...

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  4. Já eu, gostei bastante de Histórias Cruzadas, por mais que tenha que concordar com boa parte de seu texto. É um filme praticamente vendido, um conto (quase que de fadas) sobre o racismo feito para exatamente todas as idades. Mas gostei do resultado final. Embora a duração seja mais extensa do que deveria, as atuações são primorosas em escala geral.

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  5. Até gostei um pouco mais que você (só um pouco mesmo) pelas atuações que são boas, mas é realmente um filme carregadinho no melodrama

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  6. Sei pouco sobre a produção, mas pelo que tenho lido por aí é aquele típico filme com "cara de Oscar". Nada contra, mas o problema é justamente o que você expõe no texto, uma abordagem bem melosa para um tema com grande potencial.

    Quero ver pois gosto da Emma Stone e da Viola Davis.

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  7. cara, mesmo sendo descaradamente comercial e superficial, eu gostei bastante desse filme! É um feel good movie absurdamente bem feito e competente. Fez eu me sentir bem no fim, mesmo não tratando da melhor (ou da mais criativa) forma possível o tema e o período.

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